BUKKAKE

sobre um filme e uma canção


pq há tanta coisa para fazer,
e tanta qualquer coisa q fazemos -
mas, sobretudo, aquela que não fazemos,
q ficam por se fazerem num mundo imaginário.
diferente de borges, de viveiros, de godard,
oq n fiz e n faço, são consequências minhas,
de minhas totais incapacidadesalém de um certo apreço e consciência de tal incapacidade,
ao dizer que há coisas para se fazer,
além das quaisquer coisas q fazemos.


sempre, no fundo, oq quis fazer foi canção.
a beleza do canto, da pulsação:
a métrica desmedida,
do ritmo contínuo-,
como o coração.

mas o coração: não. e ouvejo a voz das coisas nas coisas q desfaço.


: sons q levam a histórias e histórias q levam a sons :


mas tudo q faço,
faço sempre por uma certa insatisfação,
constante e permanente, que me persegue:
para mim, o melhor concerto seria aquele
em que o maestro chegasse em frente dos músicos
e da plateia
e fizesse haraquiri com a batuta.


imagem que diz sons. fazer sons q não precisam de
imagem com imagens q não precisam de som. fazer imagens com sons q dizem outras
imagens.


mas, por algum motivo da vida,
me vejo agora fazendo isso:
cinema.


assim como canção,
cinema é arte de massas,
de público,
de comunicação.


sigo oq o signo do dia diz,
e pouco posso fazer disso,
se não fazer disso, algo.
sempre transportando
essa insatisfação
constante e permanente, que me persegue.


essas ideias quaisquer,
q surgem de madrugada,
q se unem às outras ideias,
q me encantam e também me perseguem como a vontade de fazer um filme
(assim como a ideia de fazer uma canção).


consequentemente, as ideias de um filme
só poderiam surgir da ideia de uma canção.

talvez meu trabalho seja de traduzir.


m
  o
    v
      ie
        m
          e
            n
              t
                o

                     aula de JLG: histórias do cinema sendo cinema imagem em movimento
sendo então o cinema A própria História em Movimento.


o narrativo, o desenvolvimento,
o roteiro, a história, a trama.
tudo isso sempre me passou despercebido,
e oq me emocionou foi como Ken Jacobs
faz pintura e consequentemente faz cinema
pq faz boa pintura e consequentemente bom cinema,
e como gravar parece sempre ser um exercício constante
de criar um olhar para o que não se olha,
de apontar aquilo q não é visto,
q sempre esteve ali despercebido,
de colocar no máximo da tela aquele mínimo,
e como Antonioni é uma busca constante
de fazer algo por meio de outra coisa,
desconstruindo tudo,
sem destruir quase nada,
e como o cinema estrutural americano
me mostrou q a liberdade é próxima do tédio,
e consequentemente da vida,
e a medida do fazer pelo
e por fazer,
q se consolida num ato radical de recusa de tudo que é,
numa janela,
numa sobreposição,
num zoom,
num ping pong de câmera,
em cores frenéticas sobre um círculo.
tudo pode ser descrito em poucas palavras.


É a chegada do trem.
É a montagem polifônica de Marienbad
É a montagem cronológica de Lituânia.
É a cinestesia de Noite.


oiticica sabia
e fazia quasi-cinema,
não videoarte ou audiovisual.


o final:
então o amante aponta uma arma para a janela
onde se vê o perfil do marido de seu amante, como uma sombra,
então ele atira,
onde se achava q era o marido do amante,
não passava de um busto do beethoven na janela.


a canção:


Talvez haja entre nós o mais total interdito
Mas você é bonito o bastante
Complexo o bastante
Bom o bastante
Pra tornar-se ao menos por um instante
O amante do amante
Que antes de te conhecer
Eu não cheguei a ser


Eu sou um velho
Mas somos dois meninos
Nossos destinos são mutuamente interessantes
Um instante, alguns instantes
O grande espelho


E aí a minha vida ia fazer mais sentido
E a sua talvez mais que a minha
Talvez bem mais que a minha
Os livros, filmes, filhos ganhariam colorido
Se um dia afinal
Eu chegasse a ver que você vinha


E isso é tanto que pinta no meu canto
Mas pode dispensar a fantasia
O sonho em branco e preto
Amor mais que discreto
Que é já uma alegria


Até mesmo sem ter o seu passado, seu tempo
O seu agora, seu antes, seu depois
Sem ser remotamente
Se quer imaginado
Se quer imaginado
Se quer imaginado se quer
Por qualquer de nós dois

Mas você é bonito o bastante
Complexo o bastante
Bom o bastante
Pra tornar-se ao menos por um instante
O amante do amante
Que antes de te conhecer
Eu não cheguei a ser


sendo essa canção,
resposta da canção
de Alf,
os personagens se delimitariamnessa qualquer ideia de um filme
sobre uma canção, e um filme cheio de canções-,
o jovem amante q atira
o amante do amante
o pianista traído.


mas o narrativo, o desenvolvimento,
o roteiro, a história, a trama:
tudo isso sempre me passou despercebido,
e o que me interessa é a busca e a exploração
sonora e constitutiva
de e em tudo q faço.


conceito:
catalogação de todas as fontes sonoras possíveis
no universo dos personagens,
desde o nível mais musical - como fones de ouvido,
caixas de som, rádios, etc -,
até a música inaudível e imperceptível
q constroem o universo dos personagens.
como quando se anda num sábado
pelo centro do rio
e vc está numa rua silenciosa e vazia
e quando vc vira a outra
e está acontecendo o samba mais lindo
e lotado q vc já viu
e vc vira a outra
e há o total silêncio novamentee surge até uma vontade de chorar.


pois oiticica sabia: oq faço é música.


e a construção paralela,
e as vidas paralelas,
através de seus mundos sonoros,
q constroem as vidas paralelas.


dietadiegéticanãodiegéticodialético


ou eu poderia filmar desconhecidos
e colocar vozes e músicas como se eles participassem do filme
ou eu poderia construir tudo sonoramente
filmando apenas as mãos
ou talvez eu só queira fazer um musical
e isso tudo seja só uma justificativa para escutar música.


e tudo isso não passe
dessa insatisfação
constante e permanente, q me persegue,
e q persegue tantos outros,
q me faz querer mais ideias quaisquerou só ouvir o Qualquer Coisa,
com essa aranha.

de Henri Daio


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