BUKKAKE

CIGARROS TREK


Me preparava para mais um dia de trabalho no escritório, me enforcava com a gravata, salões inúmeros eram preenchidos com uma estéril luz branca k4400 que emanava de quadros de alumínio presos ao teto. Homens de terno preto e orelhas biônicas passavam pra lá e pra cá, salas a prova de som para todos os lados, telas hologramáticas que projetavam a propaganda dos CIGARROS TREK, nós éramos os criadores da propaganda, nós todos somos TREK.

Eu estava no banheiro após mais uma reunião infrutífera sobre nossa nova investida na floresta da tijuca - nosso "mais novo maior foco". Àreas gigantes de verde agora se retorciam na fazenda da vida sintética. Prédios acoplavam Indústrias de galinhas genéticamente engenhadas que populavam halls imensos de concreto podre e tinta refletiva, tudo produzido para o bico de pena felpuda que adornava e caracterizada nosso mais famoso TREK RED. "Num mundo perfeito não há decomposição." dizia ele.

'A Falha da Carne' era hoje o tema de uma palestra que recebiamos semanalmente no hall. O professor de meia idade exibindo aqueles cafonas óculos Oakley de armação boleada em alumínio biocromático apresentava holotipos sobre as novas terriveis teorias da antropoarqueologia que incessantemente cavucavam as florestas cariocas: piramides incas, trepanação e o sacrifício de retirada do coração.

Víamos agora a projeção ultra realista aquele guerreiro adornado erguendo seu punhal de obsidiana em direção ao sol e dilacerando da base da barriga até a clavícula esquerda daquele cervo-humano. Era uma festa de massas amareladas e roxeadas que saltavam vivamente sob os balbucios daquela pele dourada por Deus Eligábalo. A mão suja de terra agora invadia aquela rachadura rubra em que seus ossos das costelas protuberavam apontando na direção dos céus. De uma máquina inerte de gordura mole e pus saía um coração pingante e fresco que aqueles dentes famintos agora festejavam. A carne crua do átrio venoso era mastigada como um chiclete rosa. - "Isso, era um ritual de divinação ao Rei Sol." - Ele dizia às quatro paredes silenciosas e obedientes: - "Além de devorar o coração fresco de um virgem, ainda tentavam o manter vivo por meio de técnicas obscuras para poder realizar o ato que, segundo os costumes de 631B-FA nomenclatura acadêmica que vocês bem conhecem, libertaria os espíritos maus da prisão esquelética dos homens para finalmente terem seu retorno ao coração petroleoso da Terra. Era manufaturado, na parte superior de seu crânio, um buraco por vezes oval e por vezes circular, através de um mecanismo metálico de manivela. Mas além de tudo isso aqueles povos incas habitantes da parte oeste da floresta eram conhecidos pelo seu hábito de mascar tabaco e..." - Já não tenho mais a energia para decifrar nenhuma outra de suas palavras arrastadas, durmo

Já acordado na carteira, recordo-me de uma estranha cena em que via uma montanha de zebras mortas e decompostas na rede superior de um campo de futebol perto de casa. Parece que essa soneca foi suficiente para conseguir saltar o resto tedioso que acompanhou a linda reencenação em luzes do ato divinatório.


Pesquisei por muito tempo nas redes fixas do quadro de membros da parede-fluxo da matriz central e por finalmente consegui achar algo que me agradasse. H-TBF era como se apresentava a fachada de açougue. Um amigo ligado em modificações corporais e rituais pós-profanos me deu todas as ordens e códigos específicos para eu agendar o que queria - "Bife com calabresa, farofa de inseto, terra frita e suco a passarinho." - Em retorno escutava um endereço perto da nova praia.

Entrava por um hall azul bebê até a sala indicada, o prédio todo parecia ser uma clínica geral, fachada em pedra e sinais de plástico pré moldado. Estava numa sala amarelada com uma aparente enfermeira que nem me fez nenhuma pergunta, parecia que tudo já estava decidido antes para não levantar nenhuma suspeita. Ela sentada numa mesa mexia em sua placa de acesso, parecia contatar outras pessoas e fazer protocolos rotineiros. Ela levanta, e continuando sem dizer nenhuma palavra, me dá um remédio hexagonal azul com uma inscrição estranha de tigre chinês para tomar.

Sinto um pouco estranho após tomar o comprimido com água rosa mas ainda continuo acordado. Ouço um tintilar de metais desconhecidos, lembrando o barulho que faz quando se mexe em uma caixa de pregos longos. Sem nenhum aviso há algo gelado no topo de meu crânio, mas não há dor. A açougueira cirurgiã entra em pânico ao não ver sangue nenhum no buraco onde meu cérebro aparecia nu, massa azul que agora respirava. aproveitei para meter meu dedo naquele buraco e coçar um pouco, a sensação era muito prazerosa, mas rapidamente ela rapidamente me colocou uma máscara em que tudo se apagou num susto. Acordei com uma placa de titânio no lugar da porta superior de minha cabeça, lembrando da cirurgia de Lady Godiva que o saudoso Lou Reed cantava.


Agora fumava em paz na parte de fora da megatorre posterior da companhia e de vez enquando dava alguns petelecos no titânio oval que envolvia meu crânio para ter aquela sensação tão tenra do som interno de badalar dos sinos da igreja:

TEEEEEEIN,

TEEEEEEIN,

TREEEECK? - O Quê?

de Mariana Guará


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